26.2.14

:-)

(Lago Maggiore, há dias de manhã)

Achei, e continuo a achar, que lidei muito bem com o aborto de há uns meses. Ainda hoje penso que ter ido sozinha para o hospital na manhã em que me foi feita a curetagem, ter partilhado o quarto com uma grávida com contracções muito pouco espaçadas, ter saído de lá sozinha depois de uma anestesia geral, ter ido trabalhar no dia seguinte e não ter chorado uma lágrima em nenhum destes momentos não é para qualquer uma. Mas a verdade é que a gravidez não evolutiva me marcou. Desta vez não tomo a gravidez como algo garantido por 9 meses. Estou alerta a tudo e mais alguma coisa e, durante as primeiras semanas, tenho termo de comparação, o que nem sempre é bom. Da outra vez tive um cocktail de sintomas bombástico, era impossível não notar que estava grávida (embora o tivesse ignorado por algum tempo). Desta vez, e apesar das ainda poucas semanas, já tive sintomas e já deixei de os ter. Agora sinto-me "muito pouco grávida". Diz a médica que estou tão centrada no stress que nem me apercebo dos sintomas. É bem possível. Hoje posso relaxar um pouco mais. Para já nada de anormal. Esta semana, que durou uma eternidade, terminou com sorrisos. Uma barreira ultrapassada. Muitas mais se seguem, bem sei. Mas o primeiro susto foi ultrapassado e hoje é apenas disso que me quero lembrar e é isso que quero comemorar.

24.2.14

esperança

Os primeiros tempos não foram difíceis. Estava habituada a viajar constantemente para destinos diversos, ainda que por curtos períodos de tempo. Acho que saí de casa com as malas mais do que cheias, mas sem ter verdadeira consciência de que desta vez não ia para daí a uma semana voltar. É certo que joguei pelo seguro e ainda antes de ter posto os pés no avião para ir, já eu tinha comprado a primeira viagem de regresso para daí a 3 semanas. Fim-de-semana relâmpago em Portugal e poucas horas depois estava de volta a Itália. Andava com o coração embargado e pouco depois descobri que afinal não alojava só um coração, mas dois. Muitas novidades em poucas semanas. Mas apesar da parte menos boa desta história lidei bem com tudo o que me aconteceu. Descobri-me forte, inquebrável e sozinha. Era Verão. Os dias longos e quentes trazem-me uma energia e uma coragem que o Inverno me retira. O frio definha-me, suga-me a vontade e os sorrisos. Agora, 9 meses depois da primeira partida, estou cansada deste frio que parece não querer ir embora. Olho constantemente para o calendário à espera que as semanas passem e me seja devolvido o calor morno que me aquece por fora e por dentro e me faz acreditar que tudo é possível. Imagino que estes dias seriam muito mais difíceis de ultrapassar se estivesse sozinha. Felizmente já te juntaste a mim há meio ano. A tua presença faz-me sentir menos a ausência daqueles que achava que estariam sempre lá, apesar da distância, mas que desapareceram ao longo destes 9 meses. 9 meses é um número curioso. Estou em Itália há 9 meses. Se tudo tivesse corrido bem com a primeira gravidez, no início deste mês teríamos deixado de ser dois e teríamos passado a ser três. Quando em Julho soube da má notícia pensei que gostaria de voltar a engravidar até à data prevista do parto. Seria uma forma de sentir que afinal o que mais queria não me tinha sido retirado, mas apenas adiado. Não aconteceu. A data passou sem novidades. As novidades chegaram dois dias depois na forma de um traço cor-de-rosa que de tão ténue quase não se via. E poucos dias depois chegaram as dúvidas e os receios. Vários pequenos sinais que me passariam completamente despercebidos não fosse a perda do Verão passado. Pequenos factos, irrelevantes para a maioria, mas que me deixam em sobressalto. Nuns dias prendo-me às evidências e sinto que a história se repetirá mais uma vez, noutros dias sigo as sensações que me fazem crer que é desta. Tudo indefinido. E eu aqui nesta espera feita de dor e de esperança, conforme a altura do dia. Para já posso dizer que estou grávida, pela segunda vez na vida, pela segunda vez desde que estou em Itália, grávida pela segunda vez em nove meses.

(Lago d'Orta este fim-de-semana)

20.2.14

pausa na ansiedade

Hoje o dia é de sol e à hora de almoço consegui sair à rua sem casaco. Os raios de sol a entrarem-me pela janela do gabinete tornam o futuro mais claro e mais sorridente e até o tempo que uma semana demora a passar parecer ter encurtado. Há poucos dias fui apanhada de surpresa por uma notícia inesperada e boa, e há que me concentrar na parte feliz da história. A parte da incerteza não passará mais rápido esteja eu mais ou menos ansiosa. Esta incerteza não depende de mim sequer, de modo que enquanto não há mais notícias (espero bem que não venha a haver), há que esperar por um futuro cor-de-rosa e feliz. Hoje consigo pensar assim, amanhã logo se vê.

pink (cores de Burano, 2013)

19.2.14

não havendo alternativa: aprender a esperar

A espera que devia terminar hoje continua por mais uma semana. Dizem-me para ter calma e não me preocupar. Minha gente, são mais 7 dias, 168 horas, 10080 minutos de espera! Não há como ter calma! Bem sei que pouco mais há a fazer para além de esperar, mas eu nunca fui um bom exemplo de pessoa paciente... Podia, pelo menos, estar sol para me alegrar os dias. Mas nada disso, dia cinzento, aborrecido e sensaborão.

7 dias, são mais 7 dias!



(da janela da antiga casa, o lago ao fundo, o submarino a nadar em chá ao perto)

de Veneza

Fui a Veneza num fim-de-semana prolongado e gélido. As mãos não congelaram, mas quase. Nem as luvas me valeram de muito. Esse foi o único pormenor menos bom desta viagem. O frio foi compensado pelas poucas pessoas nas ruas, o que me permitiu sentir Veneza um bocadinho minha. Cheguei já era de noite mas, ainda assim, sair da estação e deparar-me com o canal teve qualquer coisa de mágico. Adorei os recantos, a falta de carros, as muitas escadas e os pequenos detalhes espalhados por toda a cidade. Gostava muito de voltar no Carnaval, mas não sei se tenho coragem e vontade para ser mais uma na multidão.

Venice was love at first sight Gondolas end of the day red stripes

17.2.14

de Burano (para tentar enganar a espera)

Veneza foi, como já seria expectável, amor à primeira vista. Mas Burano excedeu, em muito, aquilo com que contava. Uma espécie de mini-mundo colorido cheio de pormenores deliciosos. Os vasos coloridos nas janelas a mostrar o brio dos moradores, e os muitos entendais brancos a contrastar com o colorido das paredes. É para voltar, pelo menos uma vez por ano.

a espera

A espera é o que mais me custa. Custa tanto que chega a doer. As vivências passadas, por muito que não o queiramos, marcam-nos de forma indelével. Estivesse eu a viver os momentos presentes há um ano e toda eu seria felicidade e esperança. Mas agora estes sentimentos deram lugar à ansiedade e ao medo. Só faltam mais uns dias para saber se posso respirar fundo e saborear esta fase ou se é tempo de usar toda a minha força para ultrapassar mais um obstáculo pouco simpático e ter coragem para avançar. Faltam poucos dias, mas parecem faltar tantos.


(de Malta, uma estreia no meu mapa, já este mês)

13.2.14

viver no campo

Quando me perguntam onde vivo exactamente, em Itália, já desisti de dar respostas precisas. Dizer o nome da localidade onde trabalho não traz nada de novo a quem pergunta, de modo que me refiro à cidade mais próxima, acrescentando que do sítio onde vivo até lá demoro uma hora de carro. Claro que esta última parte da informação não fica na memória de quem me ouve e assumem que vivo em Milão. Não é coisa que me aqueça ou arrefeça, de modo que não confirmo nem desminto. Acham que estou mais citadina que nunca, quando na verdade nunca vivi tão no campo como vivo agora. Ontem, o cenário a sair do trabalho e a tentar chegar a casa foi este:



Tenho pena que na foto não se vejam os muitos burros que seguiam na frente do rebanho, nem os muitos cães de guarda que tentavam orientar as centenas de ovelhas.