29.12.11

Quando há umas semanas escrevi que esta viagem iria deixar marcas, nem eu sabia a extensão que estas iam ter. E, na verdade, acho que ainda agora não tenho noção das consequências. Mas sei que só não serão maiores se eu não tiver (criar) oportunidade de fazer o que bem me apetece agora. Não me apetece deixar esmorecer esta vontade de fugir à rotina. Dizem-me que não sou dada a emoções e sentimentos frios ou mornos. Já desconfiava, mas parece que hibernei por uns tempos e agora acordei numa espécie de explosão. Sempre disse que os climas quentes e tropicais despertam em nós sentimentos que desconhecemos ter e nos deixam mais sensíveis e abertos à descoberta. Parece que confirmo a teoria na própria pele.

O regresso tem sido cheio de trabalho, de pessoas, de (re)encontros e de dias preenchidos. Tenho agora uns dias para ocupar como muito bem entender, sem obrigações e com todo o tempo do mundo.

28.12.11

a descrição parece assustadora, mas a saia é um mimo

Mini-saia, padrão viperino, com folhos.
Em Dili dormia uma média de 4-5 horas por noite. Cheguei cá e passei a dormir ainda menos. Hoje foi a primeira noite em que dormi mais de 4 horas desde que regressei. E não, não me tenho sentido cansada, mas o que é que se faz quando se acorda às 5 da manhã e não se consegue dormir mais?

27.12.11

os preconceitos são tramados

Eu, pessoa que se considera de mente muito aberta, descobri que tenho preconceitos enraizados até ao tutano. Achava eu (mas porquê?, pergunto-me agora) que qualquer pessoa que usasse farda era desprovida de inteligência, sensibilidade e tacto. OK, crucifiquem-me que eu mereço. Vai daí, o destino que é matreiro e irónico, quem é que me oferece como companheiros e amigos numa terra longínqua e algo inóspita? Um grupo de militares. Tratamento de choque contra preconceitos parvos. E não é que foi um tratamento eficaz? Se foram escolhidos a dedo não sei, mas a verdade é que aquela minha ideia de que todos (sublinhe-se o todos) os militares são totós, caiu por terra em três tempos. Foram a melhor companhia que podia ter tido, fizeram-me sentir segura, trataram-me quando precisei, ouviram-me em noites de lágrimas e tristeza, lamberam-me as feridas, fizeram-me rir e fizeram-me sentir em casa quando estava do outro lado do mundo. Se há umas semanas alguém me dissesse que eu iria passar horas na cumbersa com um amigo militar que está do outro lado do mundo, e que me iria rir em frente a um computador enquanto partilhamos disparates saudáveis e pensamentos mais sérios, eu iria sem qualquer sombra de dúvida fazer um sorriso amarelo.

afinal tinha (tenho) saudades e não sabia

Do óbvio: amigos e família.

Do acessório: conduzir (eu que nem gosto de conduzir mal me sentei ao volante senti uma liberdade difícil de explicar), chá a escaldar (limão e gengibre continua a ser o favorito), cozinhar, iogurte grego (com mel, canela e framboesas), andar de botas, usar saltos, passar horas seguidas ao telefone, pintar as unhas, trocar a cor das unhas dia sim dia não, poder usar o roupeiro todo (e não apenas aquela meia dúzia de peças que levei comigo), écharpes, banhos de imersão que duram horas, usar aquela parafernália de produtos para o cabelo, usar os cremes todos e mais alguns, pintar os olhos, pôr rímel, ir ao cabeleireiro, ter net a uma velocidade normal.

Do que tenho saudades agora: os amigos que lá ficaram, o calor que sufoca, os sorrisos, sair de casa de hawaianas, ver carros da ONU, ter que olhar para a rua com mil cuidados com receio de cair num buraco (sim, é verdade, esteve perto de acontecer; não houvesse dois braços fortes de cada lado a agarrar-me e ainda hoje estaria em Díli, com todos os meus ossinhos partidos), os leitões e as cabras na praia, as festas privadas, os sumos naturais, o quarto 304, o beef and ginger fried rice, as viagens alucinadas de táxi, a mousse de abacate, as mangas, as conversas alucinadas, a praia dos Portugueses, o andar de cima da discoteca...

ninguém merece

No dia a seguir a ter regressado tive duas arguições, logo de manhãzinha, não fosse eu esquecer-me de como é o ritmo de trabalho por estes lados. Amanhã mais duas. Ainda estou a tentar acabar de ler uma das teses, mas não está fácil.

26.12.11

(tenho cá para mim que ainda é efeito do jet lag)

Alguém que me diga que não fui a única a chorar no último episódio da Anatomia de Grey.
Tão poucas vezes o chavão "ano novo, vida nova" fez tanto sentido.

No fim do ano, e sem pensar muito nas consequências, virei a vida do avesso.
A máquina fotográfica que podia mergulhar comigo morreu em Timor. Foi para debaixo de água e sofreu uma espécie de afogamento sem retorno. Este acontecimento foi uma boa desculpa para comprar um brinquedo novo, que já namorava há uns meses, e que foi a minha prenda de Natal de mim para mim. Agora só me falta encontrar uma oportunidade neste inverno para poder levá-la a mergulhar (ou bem que é na piscina ou bem que terei de me mudar para climas menos agrestes; está bom de ver que eu voto na segunda sem qualquer hesitação!). Enquanto essa oportunidade não surge vou-me divertindo a tirar fotos panorâmicas.

25.12.11

dos fins

Apesar dos aborrecimentos inerentes, dá-me sempre um certo descanso que, depois de um ponto final numa relação, o outro reaja de forma estapafúrdia. Caso tivesse alguma dúvida sobre a decisão que estava a tomar (coisa que não me lembro de alguma vez ter acontecido, não são decisões que tome de ânimo leve), essas dúvidas dissipar-se-iam depois das reacções impensadas, absurdas e ruins da outra pessoa.
Dia 24 já se foi e eu confesso que não foi um dia muito diferente dos outros. Os sonos trocados não ajudaram à festa e a quase ausência de espírito natalício deixou-me à margem dos sentimentos habituais da época. Parece que é preciso tempo e o ambiente certo para que esse espírito se entranhe em mim.

Vivi o antes do Natal com quase 40ºC, sem quase me lembrar que estava já em Dezembro. Era trazida para o calendário real sempre que me cruzava com uma árvore de Natal. Ria-me perdidamente sempre que tirava fotos em frente ao símbolo natalício de mini-saia e chinelos. Depois, fui retirada ao calor e ao sol e, quando dei por mim, estava de casaco e cachecol em frente a uma lareira. Ainda tive esperança que esta mudança abrupta tivesse algum impacto em mim, e me trouxesse instantaneamente pensamentos vermelhos, brancos e com flocos de neve, mas nada de nada.

Apetece-me agora pensar no balanço do ano e escrever o nome na agenda nova. Se no ano passado por esta altura tinha a sensação de que este ia ser um ano importante, nunca eu podia imaginar o que me esperava (parece que o encanto da nossa existência é mesmo esse, pelo menos para quem é dado a surpresas). Foi um ano cheio. Houve momentos muito bons, houve momentos que agradecia não terem acontecido. Houve momentos de espanto, de coração cheio, de lágrimas, de arrependimento, de saudade e de tanta coisa mais.

24.12.11

o presente que mais gozo me deu oferecer este Natal

Conseguir fazer chegar um bolo-rei quentinho ao outro lado do mundo.
[Já no aeroporto, disse-me ela que às vezes as pessoas que aparentam ser mais fortes são as mais sensíveis. Acrescentou que sabia do que falava porque era igual a mim. Eu, que estava a tentar controlar a respiração de forma a não deixar escapar nenhuma lágrima, tentei sorrir, mas não consegui e também não consegui acalmar o mar que se seguiu.]

feliz Natal :)

23.12.11

sequelas

Idealmente ninguém magoaria ninguém e tudo seria muito mais simples. Mas a vida é feita de encontros e desencontros e raramente a pessoa com quem queremos estar é a pessoa que quer estar connosco. De vez em quando o universo entra em sintonia e parece que a coisa se dá, mas é pouco frequente.
Já me lançaram minas dentro do peito que devastaram tudo, sem deixar ponta de sentimento onde me agarrar. Uma espécie de floresta totalmente queimada sem uma única erva daninha verde para contar a história. E é por ja ter passado por isso que sei o quanto custa a quem está do outro lado, quando somos nós que colocamos o ponto final. Também é por essa razão que nunca um fim meu é uma estratégia ou uma jogada. O meu fim é isso mesmo: um final sem margem para negociação. Não me venham com conversas de ser muito radical e de me estar pouco importando com o outro. Houve uma altura na minha vida em que era dada a paninhos quentes. Não resolvia o que havia para resolver no imediato, andávamos ali numa espécie de morte lenta e anunciada que nunca mais se dava. Magoava-me por prolongar o que não tinha hipótese de sobrevivência e feria o outro, enquanto lhe criava uma esperança falsa.

22.12.11

Não consigo colocar em palavras o que foi o meu último mês e meio. Por mais que escolha as palavras, que as ordene e reordene, não consigo explicar o que vivi.

Ontem, de volta ao meu mundo habitual, sentia que tinha vivido durante as últimas semanas numa realidade paralela ou numa outra dimensão, e que agora tinha sido de novo remetida à minha vida normal, sem apelo nem agravo. Isto no fundo foi uma espécie de Lost: caí na ilha sem saber ao que ia, estranhei, entranhou-se, saí da ilha e agora o que me apetecia mesmo era voltar.

O que eu gostava de ser uma pessoa menos complicada.

o regresso



(ilha de Jaco, Timor-Leste)

Andei, até há bem poucos dias, de top sem mangas, mini-saia e dedos dos pés de fora. Fui a praias paradisíacas e mergulhei em águas quentes. Chego cá e sou recebida com menos uns 35ºC. Não consigo sentir espírito de Natal nenhum. Numa tentativa desesperada, meti-me num centro comercial, na esperança de que se não fosse de outra forma, o consumismo do qual estive afastada durante estas semanas se apoderasse de mim, e eu sentisse, pelo menos, essa espécie de espírito natalício. Nada de nada. Não tive vontade de comprar nada, as filas nas lojas horrorizaram-me e o frio que sentia não passou. Não sou capaz de comprar casacos de lã quando o que me apetece é estar de braços ao léu sob um sol abrasador.

19.12.11

há sempre uma primeira vez para tudo

Chorei baba e ranho enquanto fazia a mala.

[correcção e actualização: chorei baba e ranho durante dois dias seguidos]

16.12.11

Não sou insegura.
Correcção: não sou normalmente insegura. Quando me sinto insegura sei que o meu mundo foi abanado por um sismo de intensidade considerável. Esqueço-me de quem sou, de quem já fui, daquilo por que já passei, dos risos, das lágrimas. Esqueço-me de tudo e sinto-me um ovo sem casca, ali à mercê da vontade de uma determinada pessoa. E detesto, oh como detesto, esta sensação de vulnerabilidade que nada tem a ver com a pessoa que (normalmente) sou. Reajo mal a esta insegurança que toma cada parte do meu corpo e torno-me agressiva e especialmente reactiva. Ai, que isto me passe depressa, que se há coisa que me desespera (e me espanta, e no fundo, me agrada; uma espécie de sabor agridoce) é sentir-me assim, sem ser capaz de ser racional. Vulnerável e frágil, com a vida assente em sentimentos perdidos no ar, sem saber se (aquele) alguém lhes dá a mão ou não. Como é que uma pessoa saída do nada, que nada sabe de mim, provoca esta devastação interior?

15.12.11

conflitos internos é comigo

[Devia virar costas, fazer de conta que me estou pouco importando, que sim, que sou aquela pessoa sem escrúpulos e sem preocupações que muito provavelmente imagina que sou, que não há mais nada além de uns momentos bem passados. E sim, concluo que é o melhor caminho, que esta postura me vai evitar dissabores maiores, que me vai evitar dois ou três dias de desespero maior (que eu conheço-me bem e sei a devastação que aqui vai estar daqui a meia dúzia de dias) e sabe-se lá quantos de desespero já à distância. Respiro fundo. Está decidido. Fazer de conta que não tem interesse é a melhor opção.

Depois vejo-o e cai tudo por terra. Fingir sentimentos não é para mim.]

14.12.11

Continuo admirada com as surpresas que esta viagem tinha reservadas para mim. Queria eu vir para cá para colocar mais um alfinete no meu mapa de viagens e juntar mais umas fotos ao álbum e sou apanhada de surpresa por uma torrente de novidades e emoções. A menos de uma semana do regresso estou semi-desfeita por dentro. Como é habitual em mim tento lidar com tudo de forma racional e visto a máscara de pessoa forte que não se deixa ir abaixo, mas debaixo da carapaça há lagrimazitas a querer ver a luz do dia. E se, apesar de tudo, enquanto estou deste lado estou bem, não consigo sequer imaginar o que vou sentir quando der por mim do outro lado do mundo.

12.12.11

ontem tive a viagem de táxi mais alucinante de que tenho memória

Éramos três. Perguntámos ao taxista se nos levava a um bar cá do sítio. Que sim, que sim, que levava. Depois do preço regateado (sim, há que regatear sempre o preço do táxi) entramos no táxi. Já sentadinhas no banco de trás vemos chegar um amigo do taxista, que se senta ao lado dele (não era a primeira vez que acontecia, já não estranhámos). Entretanto taxista levanta-se e sai. Ficamos as três no banco de trás e o amigo do taxista à frente. O amigo olha muitas vezes para trás, para nós, com um ar entre o espantado e o esfomeado. Esperamos pacientemente (eu sei que noutro contexto teríamos saído do carro, mas em Timor tudo é diferente e difícil de explicar a quem não conhece o ambiente!). Minutos depois o taxista regressa. Pensamos nós que se vai iniciar a viagem. Pensamento errado, claro está. Chegam mais dois amigos da taxista. Um abre a porta de trás e olha para nós com ar espantado. Depois de uns segundos de medição de forças com o olhar, o moço fecha a porta do carro e encaminha-se para a mala do carro. Nós dentro do carro sem saber o que pensar. Abre a mala do carro e deita-se. E foi aqui que eu comecei a rir para só parar uma boa meia hora depois. Fui às lágrimas de tanto rir (coisa que não é difícil em mim, mas que ontem foi quase imediata). Rapaz deitado na mala do carro fecha a mala. Entretanto o segundo amigo do condutor aproxima-se da bagageira do táxi, abre a dita cuja e salta lá para dentro. O que estava deitado na mala senta-se e eis o ponto da situação:

- 3 portuguesas a rir como se não houvesse amanhã no banco de trás do carro
- um motorista
- o amigo do motorista sentado ao lado dele
- dois amigos do motorista sentados na mala, que está aberta

Arrancamos. Música aos berros, como é costume nos táxis cá do sítio (quando voltar e tiver net a uma velocidade normal prometo partilhar um vídeo). O motorista e o amigo do lado por várias vezes puseram meio corpo do lado de fora da janela para falarem de forma mais audível com os dois moços que seguiam sentados em amena cavaqueira na mala do carro. Sempre que aparecia uma curva mais pronunciada o taxista acelerava e o carro gemia ruidosamente. A dada altura o motorista deve ter achado que ainda era pouca emoção para uma viagem de táxi e decide fazer pequenos "esses". Quanta emoção! Entretanto chegámos, sãs e salvas. Os moços da mala passaram para o banco de trás e seguiram viagem alegremente.

por aqui tudo isto é normal

Para mais tarde recordar:
- há alunos que afiam o lápis com uma catana (ninguém me contou, a coisa deu-se à minha frente);
- há um funcionário responsável por abrir as portas das salas de aula (é a única função do dito funcionário). Há dias o funcionário não apareceu de manhã e mais ninguém tinha a chave (aqui tudo isto é normal). Os alunos arrombaram a porta com um pé de cabra;
- uma professora pediu a uma funcionária que estava a varrer o corredor para varrer a sala de aula. A funcionária explicou que a função dela era varrer aquele corredor, e apenas aquele (e não salas de aulas).

o destino a tentar dar-me sinais

A única explicação que eu encontro para exactamente um mês depois tornar a torcer o mesmo pé quando passava precisamente no mesmo sítio é só uma: o destino está a tentar dizer-me alguma coisa e eu não estou a perceber o quê. Se alguém entender alguma coisa destes sinais do além é favor iluminar esta alma desorientada.

11.12.11

apresento-vos o melhor de Bali: o pôr-do-sol no Tanah Lot

Bali, Tanah Lot
Há pouco, enquanto percorria o caminho entre o aeroporto e o hotel em Díli, e no rádio do carro passavam músicas de Natal, deu-me um aperto cá dentro. Quando cheguei, esta viagem a Bali parecia tão longínqua. Comentávamos entre nós que depois do regresso de Bali já só faltaria uma semana de trabalho para voltarmos a casa. Fazíamos estes comentários como se o que mais desejássemos na altura fosse voltar a Portugal. Provavelmente porque esse regresso estava, ou parecia, muito distante. Hoje, encolhida num canto do carro caiu-me em cima a realidade: já só falta uma semana. Eu sei que para alguns do grupo ainda falta uma semana, mas para mim só falta uma semana. Como é que eu vou ser feliz sem este calor todos os dias? Sem o mar ao meu lado logo de manhã? Sem o calor deste mar? Sem a praia sempre que me apetecer e o trabalho o permitir? Sem aquelas pessoas que apareceram do nada e me preencheram (os dias)?

Estou para aqui de lagrimita no canto do olho e ainda sobram uns dias de paraíso. Daqui a uma semana vai ser bonito...

7.12.11

já volto

Vou então até ali a Bali e depois regresso a Timor para a última semana.

Por que é que o que é bom passa tão depressa?

6.12.11

E agora?

O que é que eu faço com o que tenho cá dentro?
O que é que faço com o que devia ter cá dentro e que já não tenho?

5.12.11

Se a oportunidade surgisse fazia orelhas moucas à minha quase eterna máxima "não voltes ao lugar onde já foste feliz".


3.12.11

do inesperado

Se há dois meses alguém me tivesse dito que hoje estaria em Timor eu não iria acreditar.
Se há um mês alguém me dissesse que eu me iria sentir em casa neste quarto de hotel eu não iria acreditar.
Se há um mês alguém me tivesse dito que eu não teria a menor vontade de sair daqui eu não iria acreditar.
Se há um mês atrás alguém me tivesse dito que eu iria tentar procurar forma de voltar cá rapidamente eu não iria acreditar.


1.12.11

notícias do outro lado do mundo

Tenho pena de não estar a escrever praticamente nada sobre a estadia em Timor. Sei que há episódios e momentos que se vão perder, mas apetece-me bem mais vivê-los agora, do que perder tempo a descrevê-los.
A chegada cá não foi fácil. O impacto do primeiro contacto com Díli foi duro e abrupto. Mas a sensação de receio e incerteza desvaneceu-se no segundo dia, quando fui à praia e me senti no paraíso. Tenho-me sentido em casa, e agora que o tempo que falta passar cá já é menos do que aquele que já passou, começo a pensar que este intervalo de mês e meio na minha vida normal vai mesmo chegar ao fim. E, honestamente, não me apetecia nada que terminasse já. Sim, aqui falta muita coisa. Sim, eu que adoro cremes e vernizes e sapatos e malas e não vi nada disto desde que aqui cheguei. E não sinto falta nenhuma. Encontrar uma coisa tão simples como uma máscara para o cabelo pode ser uma verdadeira odisseia. Mas todos os dias tomo o pequeno-almoço com vista para o mar, e isso vale mais que mil pares de sapatos. Saio do centro de formação e almoço a um metro da praia, de hawaianas e mini-saia em pleno Inverno português. Ontem tomei café depois do jantar enquanto ouvia as ondas e me caíam em cima pingos quentes de chuva. Se eu não tinha uma ideia bem definida do que era o paraíso, agora já tenho. É a praia aqui ao lado, é o calor que chega a sufocar, é a humidade que se cola a nós, são as festas em casa de desconhecidos, é o darmos por nós sem mais nem menos no meio de uma festa num consulado, são os bares australianos, são as pessoas deslocadas como nós que se conhecem e nos surpreendem, são preconceitos que caem, são acontecimentos inesperados. Também é a serenidade, bondade e forma de ser genuína dos timorenses, os sorrisos deles e a simpatia.
E agora vou continuar a aproveitar cada minuto da estadia no paraíso. Até já.

26.11.11

Por esta é que eu não esperava...
E agora o que é que eu faço?
Eu só vim para cá trabalhar, não era suposto isto acontecer...

11.11.11

prometo solenemente não tornar a dizer mal de militares

Ontem, uma das companheiras de aventura magoou-se num pé. Ora, cá no sítio, médico é coisa rara. Depois de nos informarmos com outros emigrantes temporários rumámos, meio a medo, ao aquartelamento da GNR. Explicámos a situação e fomos atendidas em menos de três tempos. Médico mais do que simpático e competente, enfermeiros igualmente simpáticos e preocupados. Hoje, enquanto subia e descia os obstáculos do centro de formação, torci o pé. Achei que não era nada, voltei à aula. Passadas umas horitas o pé tinha inchado de forma bem visível e doía que se fartava. Lá rumámos de novo em direcção à GNR já perdidas de riso pela coincidência de em dois dias seguidas magoarmos as duas o pé direito e termos de ir bater à mesma porta. Mesmo médico, mesmo enfermeiros, boa disposição e muito boa vontade.

Cá estou coxa e com gelo em cima do pé. Amanhã regressamos à GNR para verem se estamos melhor.

Prometo solenemente não tornar a dizer nem a pensar mal dos militares, de quem, até hoje, tinha uma opinião muito duvidosa.

4.11.11

trabalho só na quarta

De modo que por estes dias a minha vida tem sido uma canseira: praia e mergulho (senti-me dentro de um aquário: corais de todas as cores e feitios e peixinhos de cores exóticas. O Nemo e família cruzaram-se comigo e mandam-vos cumprimentos). Tivesse eu acertado o relógio quando cheguei a Timor e haveria fotos do mundo debaixo de água. Como fiquei no horário de Singapura e acordei tarde e a más horas, saí a correr do hotel sem tempo para ver se a máquina que tira fotos debaixo de água ia comigo ou não. Não ia. Temperaturas ao certo não sei, mas andaremos pelos 30 e muitos graus. Os efeitos do sol já se notam por estes lados: cara muito rosada e ombro vermelhusco. A água refresca, mas não muito. Se não derreter até lá começarei a trabalhar na quarta.


Timor

habemus net

Portátil fininho para não pesar nas viagens. Tão fininho que nada de sítio para ligar um cabo de internet. Chego ao hotel e quando peço a palavra-chave para ter acesso à rede sem fios pespegam-me um cabo nas mãos. Depois de torcer o nariz lá me lembrei que tinha um adaptador para o maldito cabo da net. Adaptador este que decidiu não funcionar. Inspira, expira, pede um portátil emprestado, tenta fazer o download do driver certo e eis que voltei a estar conectada com o mundo. A uma velocidade mais lenta que o habitual, mas ligada.

2.11.11

agora já posso dizer a um crocodilo:

"Já dei uma dentadinha num familiar teu." E gostei.

em Singapura

Em trânsito.
O tempo foi muito pouco, mas aproveitado da melhor forma: templo, Clarke Quay e jantar tradicional cá do sítio. Agora parece que convém ir dormir.

27.10.11

desespero

Imaginem que sabem com 9 dias de antecedência que vão para o outro lado do mundo. Passado o choque inicial planeiam mentalmente como vão distribuir as tarefas que têm mesmo de deixar terminadas antes de se meterem no avião. Até sábado trato do que tem que ficar tratado do lado de cá do mundo, depois de sábado trato do que tem mesmo de ser preparado para o lado de lá. OK, é um calendário apertado, mas consegue-se. A vida continua com tudo cronometrado ao minuto, mas sem grandes dramas. Agora imaginem que de um momento para o outro já não vão no dia que vos tinham indicado inicialmente, mas uns dias antes. Eu nem sou pessoa de desesperar, mas também tenho limites.

25.10.11

este ano...

... começou em Hong Kong e vai terminar em Timor.

Continuo em choque, que isto de se saber com semana e meia de antecedência que tem de se arrumar a vida para ir até ao outro lado do mundo é coisa para deixar qualquer pessoa ligeiramente desorientada. Sim, vou mas volto.

18.10.11

9 da manhã, Serpa

o sofrimento por antecipação é directamente proporcional ao tempo livre

Já sofri muito por antecipação. A primeira apresentação em inglês deixou-me com dores de barriga umas boas semanas antes de acontecer. Depois, com o passar do tempo e com algum traquejo acumulado, o tempo de sofrimento foi-se reduzindo, quase sem que eu desse por isso. Agora, olhando para trás, vejo que as semanas passaram a singular, e a dada altura passaram a ser apenas dias, que mais tarde se transformaram em horas. No meio do processo comecei a conseguir tomar o pequeno-almoço nos dias de maior nervosismo, porque se o ponto-chave tinha lugar às 11, às 8 ainda eu estava serena. Houve alturas em que meia hora antes ficava nervosa, e outras em que cinco minutos antes sentia um aperto no estômago.


Nunca antes tinha pensado nisto e por isso mesmo nunca tinha chegado à conclusão óbvia. Não é que actualmente não tenha razões para em determinadas situações estar nervosa; tenho e bem mais do que há uns anos atrás, porque as responsabilidades cresceram. O que me falta hoje é tempo para pensar e, consequentemente, para ficar nervosa.


Moral da história: o sofrimento por antecipação é directamente proporcional ao tempo livre de que dispomos.

17.10.11

radio killed the video star

Há uns tempos calcorreei meia praia com um jornalista e um repórter de imagem como companhia. Ria-me sempre que alguém olhava para mim de alto a baixo enquanto tentava descobrir quem era a pessoa importante (quanta desilusão!). Quando finalmente arranjámos um lugar considerado adequado (para mim era logo no meio da areia, com o mar ali ao lado) era ver as senhoras de meia idade aproximarem-se para saberem em que canal, dia e hora poderiam ver o evento que tinham presenciado. Eu estive estranhamente calma e totalmente a leste dos olhares curiosos. Amanhã há entrevista para a rádio. Pode parecer estranho, mas assusta-me bem mais do que uma reportagem para a televisão. A imagem distrai as pessoas das palavras. Na rádio ficam só as palavras, sem nada que afaste a atenção dos ouvintes. E falar de um hobbie não tem o mesmo peso que falar de trabalho. É rezar para que o discurso me saia escorreito e coerente. Se bem que com o cansaço que por aqui anda não se augura nada de muito bom.

praia em outubro

praia em outubro

sol de outono

fim do verão em outubro

fim do verão em outubro

fim do verão em outubro



fim do verão em outubro



fim do verão em outubro



15.10.11

cansei-me

Estou cansada de ser uma cidadã e uma trabalhadora maltratada. Há uns tempo concorri, sem grande convicção, a dois ou três lugares lá fora. Depois, por razões pessoais, parei. Chegou a altura de o tornar a fazer, mas agora de forma bem pensada e organizada.

14.10.11

Sou funcionária pública mas todos os dias, para além do horário que devo cumprir, trabalho várias meias horas. Posso trocar essas meias horas pelos subsídios de férias e de Natal?

12.10.11

coisas que aprecio particularmente

Pessoas que convidamos para qualquer coisa e que não dizem nem sim nem não. Nada de nada. Também gosto bastante quando remetem a resposta para depois, e o depois não chega. Para já não lembrar aqueles que, caso o convite seja feito por mensagem, fazem de conta que não a viram (quando sabemos bem que vivem colados ao telemóvel e não têm problemas de audição), e nos telefonam umas horitas depois com trezentos e oitenta e dois motivos para não terem visto a mensagem atempadamente.



Oh minha gente, a palavra não existe e é para ser usada, mas qual é o vosso problema?

e um nascer do sol assim

(sunrise)

era um pôr-do-sol assim, todos os dias

pôr-do-sol

é torcer para que a coisa se dê, minha gente

Eu sei, é preciso ter uma grande lata para andar desaparecida em combate (é mesmo uma espécie de batalha: eu contra o tempo e o trabalho que cresce exponencialmente. Por agora parece-me que temos um empate, mas eu não gosto particularmente de perder, portanto continuo a acreditar na vitória e a esforçar-me para me livrar de todas as tarefas que todos os dias batem à porta, saltam do mail e dizem "Olá! Aqui estou eu!" por telefone) e agora vir aqui com olhos de cãozinho abandonado pedir que torçam por mim. Mas eu tenho mesmo uma grande lata e muito pouca vergonha, portanto:



Oh gente que está desse lado, é favor torcerem aqui pela menina!


Ora, num belo dia em que devia estar fechada entre quatro paredes com vista para a ria cedi à tentação, agarrei na papelada e rumei ao sul em muito boa companhia. Era Outubro, mas não era um Outubro da infância, em que as estações tinham respeito pelas datas e pelas temperaturas, e a partir da hora do almoço o calor era tanto que até abrir e fechar os olhos me causava calor. Rosa que não é pessoa para ficar muito quieta achou que mais valia ter juízo que ter uma insolação e decidiu resguardar-se na esplanada, junto a senhores de boné de tecido grosso. No meio do silêncio e da calma alentejana, o telefone da Rosa toca (ah mulher, já era tempo de teres um toque que não te envergonhe em público) e do outro lado:



Queres ir passear até X?



Rosa esquece-se da temperatura exterior, gela por dentro e claro que diz que sim, que não é pessoa para recusar um passeio seja lá para onde for, quanto mais para o outro lado do mundo e a um sítio onde, a bem dizer da verdade, nunca tinha pensado ir. Sejamos reais, a pessoa que telefonou à Rosa tem um sentido de humor interessante, o o "passear" significa "trabalhar", o que para muitos poderia retirar grande piada à proposta, mas na verdade só a tornou mais interessante.



A coisa parece tão boa quanto irreal, daí que:


Oh pessoal, está tudo a torcer para que a coisa se dê, que eu quero ir ali a X fotografar o que nunca pensei ver.

5.10.11

o dom da procrastinação

Detesto fazer limpezas. Hoje, dia em que devia continuar a ler a tese maldita, fui possuída pelo espírito de fada do lar. E agora que descobri um viveiro de pó debaixo dos gavetões, no escritório, não posso ignorar o chamamento doméstico.

4.10.11

é mesmo isto

desde as 9 a corrigir uma tese de mestrado, e o que me ocorre dizer é:

Esta gente escreve como fala e fala terrivelmente mal.

Deus, dai-me paciência e força para chegar ao fim da tese sem cortar os pulsos.

dia 27, piqueniques à segunda

dia 27


(26 de Setembro)

dia 26, a sobremesa do dia seguinte

dia 26

(dia 25 de Setembro)

dia 34, dos nossos piqueniques à segunda

dia 34

(3 de Outubro)

dia 32, anoitecer em Aveiro

dia 32

(1 de Outubro)

dia 31, elevador de água, no Bom Jesus


(30 de Setembro)

E as fotos dos outros dias? Hão de (gentes entendidas no assunto, tem hífen ou não tem hífen? Não, pois não? Maldito acordo!) aparecer quando a disponibilidade e a paciência o permitirem.

3.10.11

deixem-me dizer-vos a verdade

Eu sei que o doutoramento vos parece a pior fase da vossa vida, ou pelo menos a mais trabalhosa. Também sei que a maior parte das pessoas com quem se dão vos confirmam esta teoria. Mas pensem bem numa coisa simples: quando tinham 18 anos achavam-se os donos da verdade e também achavam que ser mais adulto era impossível, certo? Hoje, bem mais crescidos, riem-se dessas crenças totalmente despropositadas. Pois bem, eu sei que é duro ler isto, mas um doutoramento é coisa para se fazer com uma perna às costas. Eu sei, eu sei bem que agora se sentem a precisar de uma cadeira de rodas, mas acreditem em mim que não sou pessoa de mentir.

Enquanto fiz o doutoramento fui dando aulas e tinha duas lojas. Não tinha fins-de-semana livres e não dormia até tarde nem preguiçava, mas ainda assim conseguia ganhar uma corzinha no verão e tinha namorado. Aliás, sejamos totalmente honestos: fui tendo namorados. Não, a pior fase da nossa vida não é o doutoramento. Esperem pelo que vem a seguir e depois me dirão...

1.10.11

pessoas que conheço bem,

agradeço que não me mintam. Conheço-vos tão bem que antes de me mentirem já eu sei que vão mentir.

(sim, continuo com o Projecto 365. Não, não tenho tido tempo para me coçar, quanto mais para colocar aqui as fotos)

25.9.11

bolo de chocolate na caneca (em 5 minutos)

Aqui fica a receita recuperada do blog anterior, a pedido da Margarida :)


4 c. sopa farinha
4 c. sopa açúcar
2 c. sopa chocolate em pó
1 ovo*
3 c. sopa de leite
3 c. sopa de óleo**
e 1 caneca

Numa caneca colocar a farinha, o açúcar e o chocolate em pó. Mexer.
Juntar o ovo e mexer de novo.
Juntar o leite e o óleo e tornar a mexer.
Levar 3 minutos ao microondas na potência máxima (1000 watt).

Et voilà, bolinho de chocolate na caneca.


* Usei 2 ovos, porque eram pequenitos.

** Só pus 2 colheres.

23.9.11

temos que falar

Quando o vosso namorado/marido/companheiro (seja lá o que for) vos diz "temos que falar", qual é a primeira coisa que vos passa pelo pensamento?

(para tentar elucidar uma pessoa que pelos vistos desconhece o significado do "temos que falar")

22.9.11

o que eu aprecio pessoas generosas

- Desculpe, mas vinha-lhe pedir dinheiro. Já fui aos multibancos todos aqui das redondezas e nenhum tem dinheiro. Só precisava que me emprestasse dinheiro para o lanche.
- Claro. De quanto precisa?
- Dois euros chega!
- Dois euros? Só dois euros? Mas isso é muito pouco!... Tome lá dois euros e meio.

16.9.11

dia 17

dia 17

(tenho saudades de escrever)

Ando a fugir das palavras (e a refugiar-me nas imagens) porque nuns dias me falta a vontade, noutros o tempo e noutros a paciência. Outros dias há em que as palavras estão ali na ponta dos dedos, prontas a saltar para aqui, e eu mando-as inverter o sentido, porque este não é o sítio mais certo para aparecerem. Porque nuns dias me apetece escrever sobre coisas sérias e noutros me apetece aqui pôr os pensamentos surreais que quem me conhece sabe que moram escondidos em mim (ah, o bem que eu escondo esta loucura latente). Deve ser reflexo daquele meio termo que eu sei não ter.

A ver vamos se um destes dias consigo voltar ao registo sem barreiras de outros tempos, em que achava escrever apenas para desconhecidos.