29.12.11

Quando há umas semanas escrevi que esta viagem iria deixar marcas, nem eu sabia a extensão que estas iam ter. E, na verdade, acho que ainda agora não tenho noção das consequências. Mas sei que só não serão maiores se eu não tiver (criar) oportunidade de fazer o que bem me apetece agora. Não me apetece deixar esmorecer esta vontade de fugir à rotina. Dizem-me que não sou dada a emoções e sentimentos frios ou mornos. Já desconfiava, mas parece que hibernei por uns tempos e agora acordei numa espécie de explosão. Sempre disse que os climas quentes e tropicais despertam em nós sentimentos que desconhecemos ter e nos deixam mais sensíveis e abertos à descoberta. Parece que confirmo a teoria na própria pele.

O regresso tem sido cheio de trabalho, de pessoas, de (re)encontros e de dias preenchidos. Tenho agora uns dias para ocupar como muito bem entender, sem obrigações e com todo o tempo do mundo.

28.12.11

a descrição parece assustadora, mas a saia é um mimo

Mini-saia, padrão viperino, com folhos.
Em Dili dormia uma média de 4-5 horas por noite. Cheguei cá e passei a dormir ainda menos. Hoje foi a primeira noite em que dormi mais de 4 horas desde que regressei. E não, não me tenho sentido cansada, mas o que é que se faz quando se acorda às 5 da manhã e não se consegue dormir mais?

27.12.11

os preconceitos são tramados

Eu, pessoa que se considera de mente muito aberta, descobri que tenho preconceitos enraizados até ao tutano. Achava eu (mas porquê?, pergunto-me agora) que qualquer pessoa que usasse farda era desprovida de inteligência, sensibilidade e tacto. OK, crucifiquem-me que eu mereço. Vai daí, o destino que é matreiro e irónico, quem é que me oferece como companheiros e amigos numa terra longínqua e algo inóspita? Um grupo de militares. Tratamento de choque contra preconceitos parvos. E não é que foi um tratamento eficaz? Se foram escolhidos a dedo não sei, mas a verdade é que aquela minha ideia de que todos (sublinhe-se o todos) os militares são totós, caiu por terra em três tempos. Foram a melhor companhia que podia ter tido, fizeram-me sentir segura, trataram-me quando precisei, ouviram-me em noites de lágrimas e tristeza, lamberam-me as feridas, fizeram-me rir e fizeram-me sentir em casa quando estava do outro lado do mundo. Se há umas semanas alguém me dissesse que eu iria passar horas na cumbersa com um amigo militar que está do outro lado do mundo, e que me iria rir em frente a um computador enquanto partilhamos disparates saudáveis e pensamentos mais sérios, eu iria sem qualquer sombra de dúvida fazer um sorriso amarelo.

afinal tinha (tenho) saudades e não sabia

Do óbvio: amigos e família.

Do acessório: conduzir (eu que nem gosto de conduzir mal me sentei ao volante senti uma liberdade difícil de explicar), chá a escaldar (limão e gengibre continua a ser o favorito), cozinhar, iogurte grego (com mel, canela e framboesas), andar de botas, usar saltos, passar horas seguidas ao telefone, pintar as unhas, trocar a cor das unhas dia sim dia não, poder usar o roupeiro todo (e não apenas aquela meia dúzia de peças que levei comigo), écharpes, banhos de imersão que duram horas, usar aquela parafernália de produtos para o cabelo, usar os cremes todos e mais alguns, pintar os olhos, pôr rímel, ir ao cabeleireiro, ter net a uma velocidade normal.

Do que tenho saudades agora: os amigos que lá ficaram, o calor que sufoca, os sorrisos, sair de casa de hawaianas, ver carros da ONU, ter que olhar para a rua com mil cuidados com receio de cair num buraco (sim, é verdade, esteve perto de acontecer; não houvesse dois braços fortes de cada lado a agarrar-me e ainda hoje estaria em Díli, com todos os meus ossinhos partidos), os leitões e as cabras na praia, as festas privadas, os sumos naturais, o quarto 304, o beef and ginger fried rice, as viagens alucinadas de táxi, a mousse de abacate, as mangas, as conversas alucinadas, a praia dos Portugueses, o andar de cima da discoteca...

ninguém merece

No dia a seguir a ter regressado tive duas arguições, logo de manhãzinha, não fosse eu esquecer-me de como é o ritmo de trabalho por estes lados. Amanhã mais duas. Ainda estou a tentar acabar de ler uma das teses, mas não está fácil.

26.12.11

(tenho cá para mim que ainda é efeito do jet lag)

Alguém que me diga que não fui a única a chorar no último episódio da Anatomia de Grey.
Tão poucas vezes o chavão "ano novo, vida nova" fez tanto sentido.

No fim do ano, e sem pensar muito nas consequências, virei a vida do avesso.
A máquina fotográfica que podia mergulhar comigo morreu em Timor. Foi para debaixo de água e sofreu uma espécie de afogamento sem retorno. Este acontecimento foi uma boa desculpa para comprar um brinquedo novo, que já namorava há uns meses, e que foi a minha prenda de Natal de mim para mim. Agora só me falta encontrar uma oportunidade neste inverno para poder levá-la a mergulhar (ou bem que é na piscina ou bem que terei de me mudar para climas menos agrestes; está bom de ver que eu voto na segunda sem qualquer hesitação!). Enquanto essa oportunidade não surge vou-me divertindo a tirar fotos panorâmicas.

25.12.11

dos fins

Apesar dos aborrecimentos inerentes, dá-me sempre um certo descanso que, depois de um ponto final numa relação, o outro reaja de forma estapafúrdia. Caso tivesse alguma dúvida sobre a decisão que estava a tomar (coisa que não me lembro de alguma vez ter acontecido, não são decisões que tome de ânimo leve), essas dúvidas dissipar-se-iam depois das reacções impensadas, absurdas e ruins da outra pessoa.
Dia 24 já se foi e eu confesso que não foi um dia muito diferente dos outros. Os sonos trocados não ajudaram à festa e a quase ausência de espírito natalício deixou-me à margem dos sentimentos habituais da época. Parece que é preciso tempo e o ambiente certo para que esse espírito se entranhe em mim.

Vivi o antes do Natal com quase 40ºC, sem quase me lembrar que estava já em Dezembro. Era trazida para o calendário real sempre que me cruzava com uma árvore de Natal. Ria-me perdidamente sempre que tirava fotos em frente ao símbolo natalício de mini-saia e chinelos. Depois, fui retirada ao calor e ao sol e, quando dei por mim, estava de casaco e cachecol em frente a uma lareira. Ainda tive esperança que esta mudança abrupta tivesse algum impacto em mim, e me trouxesse instantaneamente pensamentos vermelhos, brancos e com flocos de neve, mas nada de nada.

Apetece-me agora pensar no balanço do ano e escrever o nome na agenda nova. Se no ano passado por esta altura tinha a sensação de que este ia ser um ano importante, nunca eu podia imaginar o que me esperava (parece que o encanto da nossa existência é mesmo esse, pelo menos para quem é dado a surpresas). Foi um ano cheio. Houve momentos muito bons, houve momentos que agradecia não terem acontecido. Houve momentos de espanto, de coração cheio, de lágrimas, de arrependimento, de saudade e de tanta coisa mais.

24.12.11

o presente que mais gozo me deu oferecer este Natal

Conseguir fazer chegar um bolo-rei quentinho ao outro lado do mundo.
[Já no aeroporto, disse-me ela que às vezes as pessoas que aparentam ser mais fortes são as mais sensíveis. Acrescentou que sabia do que falava porque era igual a mim. Eu, que estava a tentar controlar a respiração de forma a não deixar escapar nenhuma lágrima, tentei sorrir, mas não consegui e também não consegui acalmar o mar que se seguiu.]

feliz Natal :)

23.12.11

sequelas

Idealmente ninguém magoaria ninguém e tudo seria muito mais simples. Mas a vida é feita de encontros e desencontros e raramente a pessoa com quem queremos estar é a pessoa que quer estar connosco. De vez em quando o universo entra em sintonia e parece que a coisa se dá, mas é pouco frequente.
Já me lançaram minas dentro do peito que devastaram tudo, sem deixar ponta de sentimento onde me agarrar. Uma espécie de floresta totalmente queimada sem uma única erva daninha verde para contar a história. E é por ja ter passado por isso que sei o quanto custa a quem está do outro lado, quando somos nós que colocamos o ponto final. Também é por essa razão que nunca um fim meu é uma estratégia ou uma jogada. O meu fim é isso mesmo: um final sem margem para negociação. Não me venham com conversas de ser muito radical e de me estar pouco importando com o outro. Houve uma altura na minha vida em que era dada a paninhos quentes. Não resolvia o que havia para resolver no imediato, andávamos ali numa espécie de morte lenta e anunciada que nunca mais se dava. Magoava-me por prolongar o que não tinha hipótese de sobrevivência e feria o outro, enquanto lhe criava uma esperança falsa.

22.12.11

Não consigo colocar em palavras o que foi o meu último mês e meio. Por mais que escolha as palavras, que as ordene e reordene, não consigo explicar o que vivi.

Ontem, de volta ao meu mundo habitual, sentia que tinha vivido durante as últimas semanas numa realidade paralela ou numa outra dimensão, e que agora tinha sido de novo remetida à minha vida normal, sem apelo nem agravo. Isto no fundo foi uma espécie de Lost: caí na ilha sem saber ao que ia, estranhei, entranhou-se, saí da ilha e agora o que me apetecia mesmo era voltar.

O que eu gostava de ser uma pessoa menos complicada.

o regresso



(ilha de Jaco, Timor-Leste)

Andei, até há bem poucos dias, de top sem mangas, mini-saia e dedos dos pés de fora. Fui a praias paradisíacas e mergulhei em águas quentes. Chego cá e sou recebida com menos uns 35ºC. Não consigo sentir espírito de Natal nenhum. Numa tentativa desesperada, meti-me num centro comercial, na esperança de que se não fosse de outra forma, o consumismo do qual estive afastada durante estas semanas se apoderasse de mim, e eu sentisse, pelo menos, essa espécie de espírito natalício. Nada de nada. Não tive vontade de comprar nada, as filas nas lojas horrorizaram-me e o frio que sentia não passou. Não sou capaz de comprar casacos de lã quando o que me apetece é estar de braços ao léu sob um sol abrasador.

19.12.11

há sempre uma primeira vez para tudo

Chorei baba e ranho enquanto fazia a mala.

[correcção e actualização: chorei baba e ranho durante dois dias seguidos]

16.12.11

Não sou insegura.
Correcção: não sou normalmente insegura. Quando me sinto insegura sei que o meu mundo foi abanado por um sismo de intensidade considerável. Esqueço-me de quem sou, de quem já fui, daquilo por que já passei, dos risos, das lágrimas. Esqueço-me de tudo e sinto-me um ovo sem casca, ali à mercê da vontade de uma determinada pessoa. E detesto, oh como detesto, esta sensação de vulnerabilidade que nada tem a ver com a pessoa que (normalmente) sou. Reajo mal a esta insegurança que toma cada parte do meu corpo e torno-me agressiva e especialmente reactiva. Ai, que isto me passe depressa, que se há coisa que me desespera (e me espanta, e no fundo, me agrada; uma espécie de sabor agridoce) é sentir-me assim, sem ser capaz de ser racional. Vulnerável e frágil, com a vida assente em sentimentos perdidos no ar, sem saber se (aquele) alguém lhes dá a mão ou não. Como é que uma pessoa saída do nada, que nada sabe de mim, provoca esta devastação interior?

15.12.11

conflitos internos é comigo

[Devia virar costas, fazer de conta que me estou pouco importando, que sim, que sou aquela pessoa sem escrúpulos e sem preocupações que muito provavelmente imagina que sou, que não há mais nada além de uns momentos bem passados. E sim, concluo que é o melhor caminho, que esta postura me vai evitar dissabores maiores, que me vai evitar dois ou três dias de desespero maior (que eu conheço-me bem e sei a devastação que aqui vai estar daqui a meia dúzia de dias) e sabe-se lá quantos de desespero já à distância. Respiro fundo. Está decidido. Fazer de conta que não tem interesse é a melhor opção.

Depois vejo-o e cai tudo por terra. Fingir sentimentos não é para mim.]

14.12.11

Continuo admirada com as surpresas que esta viagem tinha reservadas para mim. Queria eu vir para cá para colocar mais um alfinete no meu mapa de viagens e juntar mais umas fotos ao álbum e sou apanhada de surpresa por uma torrente de novidades e emoções. A menos de uma semana do regresso estou semi-desfeita por dentro. Como é habitual em mim tento lidar com tudo de forma racional e visto a máscara de pessoa forte que não se deixa ir abaixo, mas debaixo da carapaça há lagrimazitas a querer ver a luz do dia. E se, apesar de tudo, enquanto estou deste lado estou bem, não consigo sequer imaginar o que vou sentir quando der por mim do outro lado do mundo.

12.12.11

ontem tive a viagem de táxi mais alucinante de que tenho memória

Éramos três. Perguntámos ao taxista se nos levava a um bar cá do sítio. Que sim, que sim, que levava. Depois do preço regateado (sim, há que regatear sempre o preço do táxi) entramos no táxi. Já sentadinhas no banco de trás vemos chegar um amigo do taxista, que se senta ao lado dele (não era a primeira vez que acontecia, já não estranhámos). Entretanto taxista levanta-se e sai. Ficamos as três no banco de trás e o amigo do taxista à frente. O amigo olha muitas vezes para trás, para nós, com um ar entre o espantado e o esfomeado. Esperamos pacientemente (eu sei que noutro contexto teríamos saído do carro, mas em Timor tudo é diferente e difícil de explicar a quem não conhece o ambiente!). Minutos depois o taxista regressa. Pensamos nós que se vai iniciar a viagem. Pensamento errado, claro está. Chegam mais dois amigos da taxista. Um abre a porta de trás e olha para nós com ar espantado. Depois de uns segundos de medição de forças com o olhar, o moço fecha a porta do carro e encaminha-se para a mala do carro. Nós dentro do carro sem saber o que pensar. Abre a mala do carro e deita-se. E foi aqui que eu comecei a rir para só parar uma boa meia hora depois. Fui às lágrimas de tanto rir (coisa que não é difícil em mim, mas que ontem foi quase imediata). Rapaz deitado na mala do carro fecha a mala. Entretanto o segundo amigo do condutor aproxima-se da bagageira do táxi, abre a dita cuja e salta lá para dentro. O que estava deitado na mala senta-se e eis o ponto da situação:

- 3 portuguesas a rir como se não houvesse amanhã no banco de trás do carro
- um motorista
- o amigo do motorista sentado ao lado dele
- dois amigos do motorista sentados na mala, que está aberta

Arrancamos. Música aos berros, como é costume nos táxis cá do sítio (quando voltar e tiver net a uma velocidade normal prometo partilhar um vídeo). O motorista e o amigo do lado por várias vezes puseram meio corpo do lado de fora da janela para falarem de forma mais audível com os dois moços que seguiam sentados em amena cavaqueira na mala do carro. Sempre que aparecia uma curva mais pronunciada o taxista acelerava e o carro gemia ruidosamente. A dada altura o motorista deve ter achado que ainda era pouca emoção para uma viagem de táxi e decide fazer pequenos "esses". Quanta emoção! Entretanto chegámos, sãs e salvas. Os moços da mala passaram para o banco de trás e seguiram viagem alegremente.

por aqui tudo isto é normal

Para mais tarde recordar:
- há alunos que afiam o lápis com uma catana (ninguém me contou, a coisa deu-se à minha frente);
- há um funcionário responsável por abrir as portas das salas de aula (é a única função do dito funcionário). Há dias o funcionário não apareceu de manhã e mais ninguém tinha a chave (aqui tudo isto é normal). Os alunos arrombaram a porta com um pé de cabra;
- uma professora pediu a uma funcionária que estava a varrer o corredor para varrer a sala de aula. A funcionária explicou que a função dela era varrer aquele corredor, e apenas aquele (e não salas de aulas).

o destino a tentar dar-me sinais

A única explicação que eu encontro para exactamente um mês depois tornar a torcer o mesmo pé quando passava precisamente no mesmo sítio é só uma: o destino está a tentar dizer-me alguma coisa e eu não estou a perceber o quê. Se alguém entender alguma coisa destes sinais do além é favor iluminar esta alma desorientada.

11.12.11

apresento-vos o melhor de Bali: o pôr-do-sol no Tanah Lot

Bali, Tanah Lot
Há pouco, enquanto percorria o caminho entre o aeroporto e o hotel em Díli, e no rádio do carro passavam músicas de Natal, deu-me um aperto cá dentro. Quando cheguei, esta viagem a Bali parecia tão longínqua. Comentávamos entre nós que depois do regresso de Bali já só faltaria uma semana de trabalho para voltarmos a casa. Fazíamos estes comentários como se o que mais desejássemos na altura fosse voltar a Portugal. Provavelmente porque esse regresso estava, ou parecia, muito distante. Hoje, encolhida num canto do carro caiu-me em cima a realidade: já só falta uma semana. Eu sei que para alguns do grupo ainda falta uma semana, mas para mim só falta uma semana. Como é que eu vou ser feliz sem este calor todos os dias? Sem o mar ao meu lado logo de manhã? Sem o calor deste mar? Sem a praia sempre que me apetecer e o trabalho o permitir? Sem aquelas pessoas que apareceram do nada e me preencheram (os dias)?

Estou para aqui de lagrimita no canto do olho e ainda sobram uns dias de paraíso. Daqui a uma semana vai ser bonito...

7.12.11

já volto

Vou então até ali a Bali e depois regresso a Timor para a última semana.

Por que é que o que é bom passa tão depressa?

6.12.11

E agora?

O que é que eu faço com o que tenho cá dentro?
O que é que faço com o que devia ter cá dentro e que já não tenho?

5.12.11

Se a oportunidade surgisse fazia orelhas moucas à minha quase eterna máxima "não voltes ao lugar onde já foste feliz".


3.12.11

do inesperado

Se há dois meses alguém me tivesse dito que hoje estaria em Timor eu não iria acreditar.
Se há um mês alguém me dissesse que eu me iria sentir em casa neste quarto de hotel eu não iria acreditar.
Se há um mês alguém me tivesse dito que eu não teria a menor vontade de sair daqui eu não iria acreditar.
Se há um mês atrás alguém me tivesse dito que eu iria tentar procurar forma de voltar cá rapidamente eu não iria acreditar.


1.12.11

notícias do outro lado do mundo

Tenho pena de não estar a escrever praticamente nada sobre a estadia em Timor. Sei que há episódios e momentos que se vão perder, mas apetece-me bem mais vivê-los agora, do que perder tempo a descrevê-los.
A chegada cá não foi fácil. O impacto do primeiro contacto com Díli foi duro e abrupto. Mas a sensação de receio e incerteza desvaneceu-se no segundo dia, quando fui à praia e me senti no paraíso. Tenho-me sentido em casa, e agora que o tempo que falta passar cá já é menos do que aquele que já passou, começo a pensar que este intervalo de mês e meio na minha vida normal vai mesmo chegar ao fim. E, honestamente, não me apetecia nada que terminasse já. Sim, aqui falta muita coisa. Sim, eu que adoro cremes e vernizes e sapatos e malas e não vi nada disto desde que aqui cheguei. E não sinto falta nenhuma. Encontrar uma coisa tão simples como uma máscara para o cabelo pode ser uma verdadeira odisseia. Mas todos os dias tomo o pequeno-almoço com vista para o mar, e isso vale mais que mil pares de sapatos. Saio do centro de formação e almoço a um metro da praia, de hawaianas e mini-saia em pleno Inverno português. Ontem tomei café depois do jantar enquanto ouvia as ondas e me caíam em cima pingos quentes de chuva. Se eu não tinha uma ideia bem definida do que era o paraíso, agora já tenho. É a praia aqui ao lado, é o calor que chega a sufocar, é a humidade que se cola a nós, são as festas em casa de desconhecidos, é o darmos por nós sem mais nem menos no meio de uma festa num consulado, são os bares australianos, são as pessoas deslocadas como nós que se conhecem e nos surpreendem, são preconceitos que caem, são acontecimentos inesperados. Também é a serenidade, bondade e forma de ser genuína dos timorenses, os sorrisos deles e a simpatia.
E agora vou continuar a aproveitar cada minuto da estadia no paraíso. Até já.