28.12.14

relato de um parto induzido

Assim que soube que o parto ia ser induzido, aproximadamente uma semana antes, procurei relatos de outros partos também induzidos. Encontrei um ou outro relato que me deixou descansada e outros que quase pareciam verdadeiros cenários de terror prolongados por horas e horas. A dada altura deixei de procurar informação e pensei de mim para mim o que for se verá, havemos de sobreviver. Porque o meu parto pertence ao grupo dos felizes, e imagino que, como eu, outras mulheres procurem relatos de partos induzidos, aqui fica ele. Com esse objectivo e também porque para já ainda está fresco e eu quero mesmo guardá-lo na minha memória, sem me esquecer de nada.

Chegámos ao hospital às 7:30 como nos tinha sido pedido. Estava em jejum, e cheia de fome, porque me tinham dito que o que iriam usar para provocar o parto me poderia provocar náuseas e não deveria comer nada antes. Sentia-me um pouco apreensiva, mas calma. Sentimentos que duraram algum tempo, mas se dissiparam quando depois de ter sido colocada no quarto ligada ao CTG (nada de contracções), nada mais aconteceu. Quer isto dizer que depois do CTG fiquei horas no quarto sem que mais nada se passasse. Algum tempo depois vim a saber que ainda estavam a equacionar se me induziam o parto naquele dia ou não (não cheguei a perceber porquê, depois de tudo se ter resolvido não quis saber mais nada sobre aquelas primeiras horas do dia). Fiquei furiosa e senti-me injustiçada. Não se brinca com uma grávida no (suposto) dia do parto. O stress e a ansiedade do momento já são mais que suficientes só por si, não é necessário adicionar factores externos promotores de tudo o que não beneficia a grávida naquele momento. Senti-me frágil e dei comigo a pensar que se estivesse em Portugal provavelmente não passaria pelo mesmo. Cada vez tinha mais fome e pensava que caso a indução avançasse mesmo me faltaria energia. Dei também comigo a pensar que nunca tinha imaginado que o dia do parto seria assim, e que não merecia o que se estava a passar.

No mesmo quarto que eu estava outra grávida que ia fazer cesariana. Levaram-na cedinho e mesmo muito pouco tempo depois estava de volta com o bebé. Dei comigo a desejar que me acontecesse o mesmo, que me levassem e me devolvessem passado meia hora com o bebé já do lado de fora. A sensação de injustiça que tomava conta de mim era ainda maior porque eu, que passaria por um processo doloroso e provavelmente longo, estava ainda em terra de ninguém, sem saber o que me iria acontecer, quando alguém com um parto "passivo" já tinha o seu "assunto resolvido". Naquela altura tive vontade de pegar nas minhas coisas e sair do hospital.

O meu desapontamento foi mais do que visível para a equipa que me acompanhou e a indução avançou mesmo. Tiveram o bom senso de entretanto me dar o almoço, dizendo que era já demasiado tempo sem comer. O pior que me poderia acontecer era vomitar e isso era preferível a estar esfomeada e sem energia.

Pouco tempo depois fui observada e, inesperadamente, já tinha 3 centímetros de dilatação. Não tinha sentido dores, não tinha sentido contracções, nada de nada, mas os 3 centímetros estavam lá. A obstetra rebentou-me as águas, na tentativa de me provocar contracções e acelerar o processo. Fiquei feliz ao pensar que depois das águas rebentadas não havia volta, o Miguel ia mesmo nascer. Relembrei a obstetra que queria epidural. Ela recordou-me que só a partir dos 4 centímetros, e eu dei comigo a pensar que já só faltava um, que deveria aguentar as dores até lá e que depois chegaria ao paraíso do parto sem dor. De novo ligada ao CTG pude verificar que começava a ter algumas contracções, mas nada de significativo, nada que me provocasse dor e como se viu através de novo toque, nada de dilatação a aumentar. Foi então decidido que me iriam dar ocitocina. Até aqui estive no quarto, mas entretanto apareceu uma enfermeira a dizer-me que ela me iria acompanhar a partir de agora e que deveríamos subir. E pediu para levarmos a primeira roupa do bebé. Aqui dei comigo a pensar que tinha mesmo chegado a hora, estavam-me a pedir a roupa do bebé! E lá fui eu, a enfermeira e o pai do Miguel em peregrinação para o andar de cima. Eram 14.30 e no quarto estavam visitas da ex-grávida que já tinha o bebé com ela há umas boas horas. Desejaram-me boa sorte, e acho mesmo que tive muita.

No andar de cima ficava o bloco de partos. Entrámos numa sala que tinha a marquesa para o parto, um cadeirão e mais uma série de tralha. Só pensava então já estou no sítio onde tudo se vai dar? Não há aqui mais nenhuma fase intermédia? A enfermeira perguntou-me se preferia ir para a marquesa ou para o cadeirão. Preferi o cadeirão, sabia que estar sentada ou de pé poderia facilitar a dilatação. Ocitocina a ser aplicada através do cateter, eu ligada ao CTG a  ver as contracções a aumentarem de intensidade e de frequência.  Ainda falámos e rimos os dois durante algum tempo, até que tive que me concentrar na respiração porque as dores começavam a aparecer (penso que seriam umas 15 horas). 

As minhas primeiras contracções não são passíveis de ser descritas de forma poética, senti as contracções como uma vontade enorme de fazer cocó. E a dada altura, com receio que a sensação passasse a ser algo mais, pedi para ir à casa de banho. Ainda me movimentava bem, apesar das dores já se fazerem sentir. Voltei, sentei-me no mesmo sítio e lembro-me de pensar mas será que ainda falta muito para os 4 centímetros? 

Não tive aulas de preparação para o parto. Li e ouvi experiências alheias. A respiração que fiz (de acordo com os cânones ou não) ajudou-me muito a focar-me noutra coisa que não a dor. Inspirei e expirei sempre, não me descontrolei, fechei os olhos nos momentos de maior dor, tentei ter sempre os pés bem apoiados no chão e apoiei os braços nos braços da cadeira. Tentei não me encolher nos momentos de maior dor, o que só aumentaria a minha sensação de fragilidade e dor. A dada altura apercebi-me que abria e fechava as mãos de acordo com o momento da contracção. Tudo isto me ajudou a tentar afastar a atenção da dor. Um aspecto com que não contava foi o frio e o calor que senti. No pico das contracções tinha muito calor, sentia-me corada. Quando as contracções passavam tremia de frio. Era também nesta altura, entre contracções que pedia ao pai do Miguel para me passar a água, tinha os lábios sequíssimos e tinha imensa sede.

O relógio de parede estava bem à minha frente, por isso recordo-me que eram 15.50 quando as dores já apertavam a sério e eu perguntei se já podíamos ver como estava a dilatação. A enfermeira disse que veríamos às 16.30. A proximidade das contracções foi aumentando e a sua intensidade também. Entre as 16 e as 16.30 algumas contracções foram mais prolongadas e comecei a sentir uma vontade enorme de fazer força. Apesar das dores mais intensas, as 16.30 não demoraram assim tanto a chegar. Passei do cadeirão para a marquesa e a enfermeira informa-me que a dilatação estava completa, a partir daquele momento podia fazer força quando me apetecesse. Adeus epidural!

Tinha visto um vídeo de um parto (sereno, de uma mulher corajosa) em que lhe foi dito por uma enfermeira para fazer força de forma contínua, e não pontual, porque havia muitas "barreiras" a abrir até o bebé sair. Só fazendo força de forma contínua essas "barreiras" cederiam. Lembrei-me disso a cada contracção que se seguiu. A fase de expulsão por mim poderia chamar-se explosão, porque foi isso que senti. O corpo na iminência de rebentar a qualquer momento, enquanto uma pressão brutal empurrava o bebé para fora. As dores são imensas, mas a vontade de fazer força e de terminar o processo são ainda maiores. A enfermeira fez um pequeno corte para ajudar a cabeça do bebé a sair. Senti o corte, mas no meio de tudo o que se estava a passar, foi mais dor menos dor, nada de relevante. Senti a cabeça do Miguel a resvalar para fora e na contracção seguinte senti o resto do corpo a escorregar de dentro de mim. Eram 16.53 e todas as dores desapareceram. Olhei para o lado e o meu marido chorava que se fartava. Tive vontade de rir, ou sorrir. Eu passava pelas dores e ele é que chorava. Homens!

Sempre tive dúvidas sobre a capacidade do pai do Miguel estar ao meu lado até ao momento da expulsão. Aguentou-se firme e, contrariamente às expectativas, cortou o cordão umbilical e não desmaiou!

Imediatamente após o parto colocaram o Miguel em cima de mim, pele com pele. Depois do obstetra fazer uma espécie de ponto de cruz ou macramé (nunca mais se despachava e eu queria mesmo era poder concentrar-me na pequena criatura que tinha acabado de sair de dentro de mim) passei para o cadeirão onde tinha estado antes e dei de mamar pela primeira vez. A equipa médica deixou-nos sozinhos algum tempo. Depois disso, penso que passava pouco das 18, levantei o rabinho da cadeira e voltámos ao quarto já a três. As visitas que estavam no quarto quando saí ainda lá continuavam e olhavam incrédulas para mim, por ter voltado poucas horas depois, pelo meu próprio pé e com um bebé nos braços.

Parto rápido e sem epidural era algo que achava não existir, afinal existe. O meu foi assim.

2 comentários:

  1. Fico muito feliz que tudo tenha corrido tão bem :D Valeu tudo aquilo por que passaste antes. Espero que o meu corra assim tão bem, mas com epidural, por deus :D
    Beijinhos e felicidades!

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