(Burano, Dezembro 2013)
Fui-me mudando aos poucos, mais nuns anos do que noutros. Cheguei a 2013 e mudei tudo de uma só vez. Mudei de país. Deixei tudo para trás, bati com algumas portas e fechei outras suavemente. Virei costas e dei comigo a viver em Itália. Deixei uma porta entreaberta e tu aproveitaste, entraste, e vieste ter comigo uns meses depois. Em 2013 deixei de pensar e viver no singular e passei a referir-me a nós. Um nós que chegou mais tarde do que era suposto, depois de anos de silêncio e afastamento, mas que, surpreendentemente, chegou. Estas poderiam ter sido mudanças menores se a maior não tivesse tido um fim menos feliz.
Em 2013 estive grávida. Da gravidez que não chegou a bom porto ficou uma dor imensa, uma sensação de vazio difícil de colocar em meia dúzia de palavras. 2013 trouxe-me muitas lágrimas, trouxe-me momentos em que nem sequer me atrevi a chorar, porque as forças não podiam ser desperdiçadas dessa forma. 2013 mostrou-me que sozinha consigo sobreviver a muita coisa, confirmou que me sei concentrar nos meus objectivos, que consigo encontrar mais oportunidades do que aquelas a que consigo dar resposta.
No final do ano veio o convite para regressar a Timor. Mais uma vez a possibilidade de regressar a um dos lugares onde fui mais feliz. Infelizmente não consigo conciliar as obrigações italianas com Timor. Fico triste de cada vez que penso que estarei aqui todo o Inverno, no meio da neve e do frio, quando poderia estar a beber água de côco, na praia, junto ao mar, a ver o pôr-do-sol mais bonito de que tenho memória. Há alturas em que até eu sou racional, este é um desses casos, por muito que me custe.
Viajei muito, tirei muitas fotografias, fui muito feliz. Senti que era felicidade a mais para o meu tamanho.
Vivo num apartamento com uma vista invejável. No Verão acordava e ia para a varanda beber café, apanhar sol, ver o lago e as montanhas. Começar os dias assim fazia com que eles não pudessem ser maus dias. Mas aquele também é o apartamento onde chorei a minha maior perda, aquele também é o apartamento onde passei 4 noites sozinha, sabendo que o teu coração já não batia, apesar de ainda estares dentro de mim. Aquele é o apartamento onde cheguei depois de ter chorado enquanto andava de bicicleta sem querer saber o que os outros poderiam pensar. 2014 vai começar numa nova casa. Vou continuar junto ao lago, mas outro lago. Vamos deixar de viver num apartamento e vamos ter uma vivenda só nossa. Vamos ter uma praia privada, não vamos ter uma varanda como temos agora, mas vamos ter um terraço no meio das árvores. Não vamos ter duas plantas na janela, vamos ter muitas plantas à nossa volta. Vamos poder ter um cão. E, mais relevante que tudo o resto, vamos continuar a ter-nos.
2013 foi O ano. Dissessem-me há um ano que agora estaria a viver em Itália, contigo, prestes a mudarmo-nos para uma vivenda de paredes brancas e com uma mansarda, com uma praia privada junto a um lago, e eu rir-me-ia e viraria costas. Há já muito tempo que acredito que a realidade supera a ficção, 2013 só o confirmou.
Em 2014 vamos continuar a viajar. Já há várias viagens na calha e o regresso à Ásia está marcado.
2014 vai ser muito bom, não pode ser de outra forma.